O termo interiorização refere-se a levar voluntariamente refugiados e migrantes venezuelanos do estado de Roraima para outras cidades no Brasil com o objetivo de oferecer maiores oportunidades de inserção socioeconômica e diminuir a pressão sobre os serviços públicos do estado de Roraima.
O governo federal estima que cerca de 260 mil refugiados e migrantes venezuelanos vivem atualmente no Brasil. A grande maioria dos venezuelanos adentram o país através de Pacaraima em Roraima na fronteira com a Venezuela, uma pequena cidade de 17.000 habitantes que passou a conviver com aproximadamente 500 venezuelanos cruzando a fronteira diariamente.
Grande parte dos venezuelanos seguem para Boa Vista, a capital do estado de Roraima, 215km distante de Pacaraima, com 420.000 habitantes. Estima-se que os venezuelanos já representam 10% da população da cidade.
Esta é uma situação nova para estas cidades pois desde 2014 a Venezuela enfrenta uma crise econômica e humanitária, porem o fluxo migratório acentuou-se em 2016 e seguia forte até 2020 quando as fronteiras foram fechadas em função da pandemia.
O estado de Roraima, onde ambas cidades estão localizadas, tem o menor Produto Interno Bruto (PIB) do país, além de ser o estado com a menor densidade demográfica. Consequentemente, a infraestrutura pública e os serviços destas cidades sofreram um impacto com o rápido e crescente contingente de migrantes e refugiados.
Uma das maneiras encontradas para melhor acolher os refugiados e migrantes sem sobrecarregar a infraestrutura destas cidades é o processo de interiorização, enviando-os a outras cidades do país.
O Governo Federal Brasileiro com o apoio da ACNUR (Agência da ONU para Refugiados), OIM (Organização Internacional para as Migrações) e outras agencias das Nações Unidas e entidades da sociedade civil, são responsáveis pelo “Operação Acolhida” que já interiorizou 50.000 pessoas desde o seu início em abril de 2018.
Uma pesquisa conduzida pelo ACNUR (Agência da ONU para Refugiados) com 360 famílias venezuelanas interiorizadas revelou que 77% delas encontraram emprego algumas semanas após chegarem às cidades de destino (contra 7% com emprego antes da interiorização). A maioria já tinha renda suficiente para pagar aluguel, e todas as famílias tinham pelo menos uma criança na escola (contra 65% antes de serem interiorizadas).
Para saber mais, acesse: https://www.acnur.org/portugues/2021/04/20/interiorizacao-beneficia-mais-de-50-mil-refugiados-e-migrantes-da-venezuela-no-brasil/
O programa é bem estruturado e os resultados são encorajadores.
A cidade de Manaus, no estado do Amazonas, é o centro financeiro, corporativo e mercantil da região norte do país e fica a 750km de Boa Vista. Por essa razão, é o destino de muitos venezuelanos em busca de melhores condições de vida e oportunidades de trabalho, inclusive, através do programa de interiorização.
Manaus foi uma das cidades mais impactadas pelo COVID, e combinado a abrigos lotados e economia instável, um número crescente de Venezuelanos encontraram-se sem fonte de renda e sem onde morar. Pedir dinheiro em semáforos e viver nas ruas tornou-se a única opção disponível para um relevante número de pessoas.
Uma vez interiorizados de Boa Vista a Manaus, uma nova interiorização para outra cidade pode tornar-se mais complexa.
O Sul e Sudeste do país, regiões com maior PIB, podem oferecer mais oportunidades de trabalho a estes refugiados e migrantes, mas é necessário construir uma conexão com eles desde Roraima para que o processo de interiorização seja realizado apenas uma vez. Existem organizações conectando os venezuelanos em Boa Vista a vagas junto a iniciativa privada em outros Estados, porém é ainda insuficiente para atender toda a demanda. Este tipo de ação ajuda a combinar a busca por trabalho por parte dos venezuelanos e a falta de mão de obra em algumas empresas que vem expandindo sua capacidade de produção, mas não encontram trabalhadores na região em número suficiente para preencher todas as vagas. Foi o caso em Dourados (MS), para onde foram 2.517 venezuelanos, e Chapecó (PR), que já recebeu 1.056, onde especialmente os frigoríficos necessitavam de mais trabalhadores.
São Paulo fica a mais de 3.000 kms de distância de Boa Vista, e essa distância torna a conscientização da situação vivida pelos refugiados baixa nos estados do Sul, onde vemos uma pequena comunidade venezuelana.
Mesmo assim, dos 50 mil interiorizados pela Operação Acolhida, 8.000 seguiram para o Estado de São Paulo e quase 25.000 para os 3 estados do sul.
Dentre as pessoas que estivemos em contato para acolhimento na AIRE, recebemos casos de pessoas que já foram interiorizadas uma vez de Boa Vista a Manaus e com dificuldades para serem interiorizadas novamente, outros que não possuíam os documentos necessários para candidatarem-se a este processo, alguns que utilizaram de sua reserva para comprarem a passagem de avião, porem todos mencionam a dificuldade de encontrar emprego em Manaus e Boa Vista neste momento como principal razão para mudarem-se em direção ao sul do país.
A AIRE tem buscado criar uma rede de colaboração para a recolocação destas pessoas no mercado profissional. Em geral, são pessoas que buscam sua independência financeira e sua casa, e através disso, querem prover um futuro melhor para seus filhos, trazer o restante da família que ficou na Venezuela ou enviar uma ajuda regular.
O acesso ao emprego formal é considerado um dos principais indicadores do sucesso da interiorização, pois gera estabilidade, integração a sociedade e dignidade.
https://tab.uol.com.br/edicao/crise-venezuela/#page17
http://aplicacoes.mds.gov.br/snas/painel-interiorizacao/
https://www.unicef.org/brazil/crise-migratoria-venezuelana-no-brasil